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Um voto em Marcelo Adnet

 

Bolsonaro não deixa dúvida. Sua primeira agenda externa para o segundo turno foi uma simbólica visita a um batalhão da PM, onde revelou sua versão do “nós e eles” ao anunciar: “Teremos um dos nossos lá em Brasília. Caveira!”. A tropa reunida para recepcioná-lo teve a confirmação disso ao ouvi-lo defender a aplicação automática da legítima defesa ou “excludente de ilicitude”, isto é, sem precisar de provas para policiais militares que matem em serviço. “Após o cumprimento de uma missão, vocês devem ser condecorados, não processados.”

A declaração coincidiu com a operação que prendeu 32 PMs do 28º Batalhão, conhecidos como bad boys que faturavam R$ 200 mil por semana com tráfico de drogas. Eles fazem parte da chamada “banda podre” que infesta a corporação e com certeza gostaram do anúncio, que para eles soa como uma licença para matar.

Quem não gostou foi a Procuradoria Geral da República, que se opõe a essa indevida interferência no Código Penal. Como disse a subprocuradora Luiza Frischeisen, “a excludente de ilicitude já existe, mas depende de prova”. Bolsonaro sonha com um maniqueísmo testado durante os 21 anos em que o Brasil foi governado por uma ditadura que já nos dividiu entre militares e civis, entre o bem e o mal, os patriotas e os subversivos, um país que se deveria amar assim, incondicionalmente, ou deixá-lo.

Ele gostaria que no seu governo o ministro da Educação fosse um general, e o modelo de escola fosse o militar, pois ensina “educação moral e cívica, cultiva o respeito às autoridades, o amor à pátria, o respeito à família e no intervalo não tem maconha. E o pessoal corta o cabelo”.

Por via das dúvidas, vou passar a máquina zero no que resta do meu.

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Se você não aguenta mais o clima reinante, as ofensas, os xingamentos mútuos, se fica desanimado só em pensar que vem mais guerra pelo WhatsApp, se, enfim, você está — para usar um eufemismo — de saco cheio, tenho uma sugestão. Vá ao site do GLOBO, ou recupere o “Conversa com Bial” no Globoplay, e veja o “Tutorial dos candidatos”, de Marcelo Adnet.

É a surpresa mais agradável que essa eleição nos reservou. Numa terra que já nos deu Chico Anysio, gênio da imitação, não esperava encontrar outro talento à altura. O mais curioso é que seu sucesso se deve à ausência de elementos que estão na moda: o ódio, o ressentimento, a baixaria. O riso que ele provoca não é de raiva, de vingança, de represália contra um ou outro. A gente ri de todos.

Não há nada mais engraçado do que Adnet na pele dos candidatos. Há muito tempo não ria tanto.

Ainda bem que ele começou uma nova fase com outros personagens.

O Globo, 19/10/2018